O Ministério da Saúde desconhece a causa das mortes inesperadas após 40 dias ultrapassando o limite de confiança, coincidindo com a sexta onda da covid.
O excesso de mortalidade que a Espanha está relatando colocou nosso país na vanguarda da Europa neste sentido. Conforme relatado por O OBJETIVO, a Espanha registra um número surpreendente de mortes inesperadas que, em novembro, quadruplicou as mortes por covid. Isso é coletado pelo sistema de monitoramento diário de mortalidade (MoMo) do Ministério da Justiça. E o seu equivalente a nível comunitário, o EuroMoMo, qualifica que estes dados correspondem a um “elevado excesso” de mortes inesperadas para o qual o próprio Governo não sabe dar uma explicação.
Especificamente, o excesso de mortalidade na Espanha fica atrás apenas da Holanda, Bélgica e Suíça. Nosso país também está à frente do Reino Unido, Itália ou França, segundo dados do EuroMoMo já praticamente consolidados a partir da semana 48. Na semana 49, a última disponível, a Espanha aparece como a primeira em excesso de mortalidade, mas o habitual atraso na transmissão dos números de cada um dos países não permite tirar conclusões.
“Há 39 dias vivenciamos um excesso de mortalidade”, avisa Rafael Cascón Porres, engenheiro da Universidade Politécnica de Madri (UPM) e membro de um grupo de trabalho da UPM que assessora a Comunidade de Madri desde o início da pandemia para interpretar as figuras MoMo. De 8 de novembro a 16 de dezembro, o MoMo registrou 4.471 mortes inesperadas, “um número muito superior ao das mortes por covid”, insiste Cascón, que considera um possível subdiagnóstico de casos como uma “hipótese” mais factível de coronavírus.
39 dias com excesso de mortalidade
O grupo de trabalho UPM não descarta que, como argumentam algumas vozes críticas, a lacuna de dados se deve a um problema na medição MoMo. No entanto, duvidam que sim, porque o excesso de mortalidade registrado pelo MoMo na primeira onda da pandemia, em 2020, foi finalmente refletido nos dados do INE. Nesse sentido, Cascón também lembra que “isso já aconteceu” no verão passado, na quinta onda, quando o número de mortes inesperadas foi o dobro das mortes por covid. No caso da sexta onda, o desencontro é ainda maior, apesar de em termos absolutos os números serem menores.
Especificamente, o MoMo registrou, em novembro, 2.994 mortes a mais do que o esperado. No mesmo mês, o número de mortes pelo coronavírus girava em torno de 700, segundo relatórios oficiais do Ministério da Saúde. Ou seja, o excesso de óbitos praticamente quadruplica os dados de óbitos por covid, conforme evidenciado pelo gráfico a seguir, elaborado pelo grupo de trabalho UPM com dados do MoMo e do Ministério da Saúde.
“Seja por covid, seja por outra coisa, o importante seria saber o porque, mas não se faz nada”, lamenta o especialista, que também destaca que “a Espanha é o país da Europa Ocidental com menos testes de covid”, de acordo com dados compilados pela Universidade Johns Hopkins, que joga a Espanha para as últimas posições neste quesito.
“O mais surpreendente é que em 39 dias com um excesso de mortalidade tão significativo, e contando com um serviço de alerta do Instituto Carlos III, nada se diga por aqui”, frisa Cascón: “Se não é covid, há outra doença que está matando as pessoas, e enquanto estiver no tempo, é preciso descobrir o que é”. “Não entendo porque os motivos para isso não estão sendo questionados… Enquanto não dissermos que temos esse excesso de mortes, é como se não tivessem”, enfatiza O OBJETIVO em depoimentos.
Sem explicação do Governo
Agora, com um excesso de mortalidade que quadruplica as mortes causadas pelo coronavírus, as autoridades sanitárias ainda não dão uma resposta clara a esse assunto. Nenhuma das administrações consultadas soube responder porque é que se deve esta mortalidade excessiva.
O Ministério da Saúde, quando questionado sobre este jornal, refere-se às palavras da ministra Carolina Darias na última quinta-feira na comissão do ramo no Congresso dos Deputados, onde o titular da área destacou que o sucesso da campanha de vacinação e as atuais cifras: “Os percentuais de internação e UTI são até três vezes menores e, no caso de óbitos, quase dez vezes menores, do que na segunda, terceira e quarta onda”.
“Se você olhar, exceto na primeira onda, que se concentrou em Madrid, nas demais ondas sempre houve um aumento, não em uma única comunidade, mas em três comunidades, principalmente no nordeste da Espanha, especialmente em Navarra, País Basco e Aragão”, respondeu Darias a perguntas do porta-voz da Vox, Juan Luis Steegman, a esse respeito: “Também gostaria de saber o porquê”.
Steegman tinha destacado o excesso de mortalidade registrado na Espanha: “Temos mais excesso de óbitos (12,42%) (…) do que o Reino Unido (11,3%), Portugal (9%), Holanda (8,8%) ou Bélgica (8,7%)”.
“Não estamos indo bem lá”, disparou Darias: “Garanto-lhes que não tem nada a ver com governos, se há uma coisa sobre a qual sabemos é que o vírus não entende fronteiras ou ideologias. […] Pode haver comportamentos sociológicos, de que sejam necessários mais lockdowns… O que você tem que fazer é tomar medidas, como eu sei que todos os governos estão fazendo”.